Descobri que sou uma pessoa intensa.
E dessa intensidade não me arrependo. Quero a vida para vivê-la, em plenitude. Sorvo todo o conhecimento possível do mundo para aprimorar-me e descobrir-me. Para matar as minhas sombras, talvez. Que são muitas. Sinto ter mais sombras do que luz e só quem me vê realmente, disso se dá conta. Quem me amou soube que sou capaz das piores loucuras. Das mais insanas atrocidades. Sim, escorpiana de corpo e alma, esta sou eu.
O espelho traz a resposta aos meus anseios: mostra-me uma imagem risonha, moleca, sacana. Alguém que pensa na vida e a vive, antes de tudo. Sem meia medida, sem moderação. Na plenitude do tempo, acima de todo e qualquer espaço. A cada passo, um rosto e a cada rosto uma miragem.
Vivo uma viagem por dia e em cada face vejo poesia. Uma estória não contada, um milagre inacabado, um mito escondido, incosciente misterioso. Sim, esta sou eu.
Nos sonhos descubro mais de mim mesma: loucuras despedaçadas contam das avenidas que moram em mim. Avenidas que não se cruzam, jamais se encontram. Rumam por caminhos perdidos, em busca do caveleiro inexistente, do cálice perdido. Rumo ao sagrado encontro comigo mesma.
Nos sonhos sonho um pouco mais de mim mesma e me vejo despida de preconceitos, aberta, nova, límpida. Tal qual cachoeira a cair por entre as pedras, sou o rio que a recebe de braços e peitos abertos, despidos, nus. Margeadas por flores corro por entre tocos que se tocam e jamais se encontram. Tal qual nossos encontros na vida. Embora rápidos, não deixam de ser complexos e não menos, densos. Complexa, densa, intensa, sim, esta sou eu. Me amem assim ou não, pouco me importa. Assim nasci, assim vivo e gosto. Aprendo com os erros e erro para não deixar de aprender. Assim cresço a cada dia e me envaideço com aquilo que já sei. Envaidecida fico ensandecida quando percebo que na verdade nada sei. Confortada fico quando vejo que na verdade nada sabem os homens e nem os deuses, pois que nem aqui vivem. Então converso e verso na tentativa de compreender a loucura do existir. Não há nada melhor do que uma boa conversa e um pouco de poesia. Sim, há coisas melhores mas enfim... Tudo na verdade é bom se feito com intensidade e sem medida certa.
Os meus olhos refletidos na água
não vêem senão miragem
imagem distorcida de mim mesma
a que quero dar nome
mas não consigo
Mais bela é a lua quando se reflete
e dela vemos somente a cor prateada
Feia é esta face já acabada
ruborizada por todos os pecados
que a vida forçou a cometer
onde é que mora a princesa do jardim?
senão dentro de mim?
gozado, quando me vejo
não a vejo
está ela a brincar de esconder-se?
ou quer não me ver, para ver-se?
Mais bela é a lua quando se reflete
e dela vemos somente a cor prateada
onde é que mora a princesa do jardim?
senão dentro de mim?