segunda-feira, 29 de agosto de 2011

Esta sou eu

 
Descobri que sou uma pessoa intensa.
E dessa intensidade não me arrependo. Quero a vida para vivê-la, em plenitude. Sorvo todo o conhecimento possível do mundo para aprimorar-me e descobrir-me. Para matar as minhas sombras, talvez. Que são muitas. Sinto ter mais sombras do que luz e só quem me vê realmente, disso se dá conta. Quem me amou soube que sou capaz das piores loucuras. Das mais insanas atrocidades. Sim, escorpiana de corpo e alma, esta sou eu.
O espelho traz a resposta aos meus anseios: mostra-me uma imagem risonha, moleca, sacana. Alguém que pensa na vida e a vive, antes de tudo. Sem meia medida, sem moderação. Na plenitude do tempo, acima de todo e qualquer espaço. A cada passo, um rosto e a cada rosto uma miragem.
Vivo uma viagem por dia e em cada face vejo poesia. Uma estória não contada, um milagre inacabado, um mito escondido, incosciente misterioso. Sim, esta sou eu.
Nos sonhos descubro mais de mim mesma: loucuras despedaçadas contam das avenidas que moram em mim. Avenidas que não se cruzam, jamais se encontram. Rumam por caminhos perdidos, em busca do caveleiro inexistente, do cálice perdido. Rumo ao sagrado encontro comigo mesma.
Nos sonhos sonho um pouco mais de mim mesma e me vejo despida de preconceitos, aberta, nova, límpida. Tal qual cachoeira a cair por entre as pedras, sou o rio que a recebe de braços e peitos abertos, despidos, nus. Margeadas por flores corro por entre tocos que se tocam e jamais se encontram. Tal qual nossos encontros na vida. Embora rápidos, não deixam de ser complexos e não menos, densos. Complexa, densa, intensa, sim, esta sou eu. Me amem assim ou não, pouco me importa. Assim nasci, assim vivo e gosto. Aprendo com os erros e erro para não deixar de aprender. Assim cresço a cada dia e me envaideço com aquilo que já sei. Envaidecida fico ensandecida quando percebo que na verdade nada sei. Confortada fico quando vejo que na verdade nada sabem os homens e nem os deuses, pois que nem aqui vivem. Então converso e verso na tentativa de compreender a loucura do existir. Não há nada melhor do que uma boa conversa e um pouco de poesia. Sim, há coisas melhores mas enfim... Tudo na verdade é bom se feito com intensidade e sem medida certa.
Os meus olhos refletidos na água
não vêem senão miragem
imagem distorcida de mim mesma
a que quero dar nome
mas não consigo
Mais bela é a lua quando se reflete
e dela vemos somente a cor prateada
Feia é esta face já acabada
ruborizada por todos os pecados
que a vida forçou a cometer
onde é que mora a princesa do jardim?
senão dentro de mim?
gozado, quando me vejo
não a vejo
está ela a brincar de esconder-se?
ou quer não me ver, para ver-se?
Mais bela é a lua quando se reflete
e dela vemos somente a cor prateada
onde é que mora a princesa do jardim?
senão dentro de mim?

segunda-feira, 15 de agosto de 2011

Por que


Estar doente da alma é como estar doente dos olhos. Não vemos as cores, não sentimos os aromas, os sabores. Passamos a não enxergar mais o mundo tal como ele é. Aliás, nos indagamos: como o mundo é? Tudo deixa de fazer sentido. A vida, em si mesma, ganha uma vacuidade e torna-se assim, um nada abissal, profundo. Nada, nem ninguém nos motiva. Muito menos nós mesmos. Olhamo-nos no espelho querendo arrancá-lo longe e para sempre repetindo baixinho: por que, por que, por que. Não tem a ver com ser feio ou bonito, longe disso. Tem a ver com ser. A investigação é mais profunda e passa no âmago do que é o ser humano, em sua raíz, suas origens. Para que, por que. Por que, por que, por que.
Nesses dias meu melhor amigo é um menino cabisbaixo que senta na primeira carteira da sala, desenha corações e casas com árvores e borboletas durante as aulas e nos intervalos, se arrisca a pedir um croissant de queijo na cantina para comer sozinho nos bancos da quadra, observando de longe os seus colegas de sala jogarem bola com destreza. Depois que termina de comer ele se projeta para dentro da quadra e sabe que era ali que queria estar, desde o começo. Por que, por que, por que, o meu amigo se pergunta.
Projeto-me de fora para dentro da vida tentando encontrar seus caminhos. Em seus meandros, não ecoam respostas, nem sequer ao longe. E tal como o menino me escondo por detras de um croissant de queijo enquanto a vida acontece mesmo num jogo de futebol. Por que, por que, por que.

quarta-feira, 10 de agosto de 2011

Casa

Cada um tem uma casa.
Algumas enormes, outras minusculas.
Coloridas ou em preto e branco.
Casas com goteira ou com colcha e almofada.
Casas com jardim ou sem privada.
Casas.
Construimos nossa casa quando nascemos.
Tijolo a tijolo.
E quando crianca sao nossos pais que colocam as nossas paredes.
Fixam os nossos limites.
Porem, crescemos.
E entao moldamos o nosso telhado.
Goteja, as vezes.
E percebemos o desvio do nosso olhar.
Miravamos o ceu, as estrelas.
E nos esqueciamos da telha.
Entao a casa nos chama.
E eh preciso dar-lhe atencao.
Olhar para as paredes, reconhecer os limites.
Curvar-se.
Eis que entao vem a chuva.
E nada de gotejar.
Sim, eis a hora de sair para fora.
Cuidar do jardim.
Das flores, macieiras, mangueiras.
Bebericar agua junto com o beija-flor.
Abrir as janelas.
Ah
Eh chegada a hora de abrir as janelas....
O sol raia la fora.
O vento sorrateiro sopra nas folhas.
Vem e vao os passaros, cantando.
A casa esta pronta.
Aberta.
Podemos agora receber outrem.
Somos alguem.
Casa.
Asa divina.
Divina asa.
Casa.

terça-feira, 9 de agosto de 2011

Passaro

A verdade é que nada existe
Nem ela mesma é verdadeira
pois se nada existe, eis que a verdade inexiste
Tal como num giro voraz
o pássaro se desfaz
e o que era dele
nada mais se fez
senao a sua inexistencia, voraz
Nascido para ser, pássaro
Em voos novos e acalentados
eis que ele se descobre um com o céu
vento, sol, estrelas
pássaro
o mesmo do mesmo
e nada, ao mesmo tempo
simplesmente voraz tempo que em tudo culmina
e iluminado o pássaro compreende
o vazio é a essencia do que inexiste
vazio cheio de nao vazio
completo ser de nao ser
e assim tudo nao é senao que mais aquilo que inexiste
saber em nada alivia
nada acrescenta
pois  a roda da vida continua a girar
impetuosa
anímica
a roda, gira

quarta-feira, 3 de agosto de 2011

Escrever

Um papel em branco é uma oportunidade. Vislumbrar idéias e colocá-las no papel é mágico.
Da tinta da caneta saem palavras de um imaginário colorido e aguçado.
E assim os sentimentos vão ganhando forma, e cor.
Do simples sentir, passam ao existir. E, uma vez no campo da existência, podem ser compartilhados com todos aqueles que os lêem.
Escrever é como navegar por águas desconhecidas... É destrinchar o seu interior e dar forma a todos os fantasmas que aparecem.
E por mais incrível que possa parecer, o milagre acontece! Os fantasmas, uma vez no papel, tornam-se cada vez menos densos e até, quem sabe, tornam-se nossos amigos. A angústia evapora e em seu lugar um bem sentir se aprimora.
Escrever é como operar. Você abre o tecido adiposo, depara-se com sangue, ossos, vísceras, mexe, cutuca, faz a cirurgia e fecha. Ainda pode reler, ou seja, dar os pontos finais e depois convive não mais com aquela dor que ocasionou a cirurgia, mas sim com a cicatriz. A marca fica, para sempre ali, mas ela por sí só não lhe causa dor ou desconforto. Como marca desafia-te a lembrar dela a todo o momento mas não que a lembrança vai lhe fazer cair em prantos. Não, a cirurgia está feita e o tumor, retirado.
O texto imitou a vida: começamos na Walt Disney e terminamos no ER. O que importa, no percurso, é se dar conta de que estamos vivos e que isso é um milagre. Por isso recomendo a escrita: ela te desperta para o sentido da vida e te coloca mais perto de você mesmo.

segunda-feira, 1 de agosto de 2011

Segredo

Nada que vem na vida é definitivo. Assim como mudam as estações, alteram-se as circunstâncias e as pessoas. E se por um lado é um processo sofrido, já que nos apegamos a quase tudo, por outro é uma ótima chance de nos recriarmos em cada nova oportunidade e de nos percebermos cada vez mais inteiros.
Se congelamos no tempo, só sofremos. Fácil é se apegar ao passado e as lembranças das quais ele está carregado. Difícil mesmo é viver o presente. Porque o passado vive nos cutucando e nos impondo suas culpas e seus pesares. Mas é hora de dizer chega. Sim, é chegada a hora de se levantar e esquecer. Deixar o que foi lá atrás e olhar para o agora. Perceber cada instante e apreciar a sua beleza.
É chegada a hora de curtir o presente e de esquecer todo o sofrimento. Porque a culpa nada mais é que uma hipótese. E a saudade, uma miragem. Aproveitar quem está ao nosso lado, desfrutar daquilo que a vida traz, nos satisfazer com o que temos. Esse é o segredo.